Contrato Especial de Trabalho Desportivo: Por que o Esporte é Considerado um Trabalho Especial?

O trabalho esportivo é reconhecido como especial, pois o atleta utiliza seu próprio corpo como ferramenta de trabalho, exigindo esforço físico intenso e cuidados constantes com sua integridade. Esse tipo de contrato apresenta um caráter híbrido, onde o empregador assume o dever de preservar as condições físicas do empregado. Para isso, é comum a contratação de profissionais de suporte, como fisioterapeutas e preparadores físicos, visando o desenvolvimento técnico e a recuperação do atleta. Conforme disposto na Lei Geral do Esporte, LEI Nº 14.597, DE 14 DE JUNHO DE 2023, essas medidas são essenciais para garantir o bem-estar e o desempenho contínuo do atleta.

Esse contrato também incorpora cláusulas rigorosas de integridade, anticorrupção e antidoping, essenciais para a segurança e a justiça nas competições. É indispensável que o contrato desportivo inclua cláusulas para impedir que o atleta pratique atos que violem as regras do jogo ou influenciem indevidamente os resultados das partidas. Diferentemente dos contratos comuns, a violação dessas normas não necessariamente resulta em rescisão imediata, pois isso poderia desestabilizar a equipe.

Além disso, o contrato desportivo leva em consideração a carreira curta e os desafios específicos do atleta, como o desgaste físico, a exposição midiática e a necessidade de planejamento pós-carreira. Esses fatores influenciam diretamente nas cláusulas acordadas entre clubes e atletas. Em modalidades como o futebol, os contratos seguem modelos estabelecidos pela CBF, mas permitem ajustes específicos conforme necessário.

Carga Horária e Restrição de Atividades:

Outro aspecto único desse contrato é a gestão da carga horária e das atividades físicas. O planejamento dos treinos é realizado de forma criteriosa para minimizar riscos de lesão, e alguns clubes, inclusive, restringem atividades físicas externas sem supervisão, o que difere dos contratos tradicionais, onde o empregador geralmente não regula atividades externas do empregado.

Cláusulas Específicas e Condições de Rescisão:

Os contratos desportivos são obrigatoriamente por prazo determinado, e possuem cláusulas específicas de rescisão, a cláusula compensatória e a cláusula indenizatória desportiva.

A Cláusula Indenizatória Desportiva é estabelecida para situações de transferência do atleta antes do término do contrato, sendo aplicável quando uma nova equipe deseja contratar um jogador ainda vinculado a um clube. Neste caso, a cláusula especifica o valor que o clube contratante deve pagar ao clube atual para liberar o atleta. Esse valor é estipulado em contrato e deve respeitar limites estabelecidos pela legislação:

  • Para transferências dentro do Brasil, o valor da cláusula indenizatória pode chegar até 2.000 vezes o salário mensal do atleta.
  • Em contratos internacionais, esse valor pode ser definido sem um limite máximo, sendo acordado entre as partes e respeitando os regulamentos internacionais, como os da FIFA.

Essa cláusula protege o clube formador ou atual, valorizando o investimento feito no atleta.

A Cláusula Compensatória Desportiva é acionada em casos de rescisão antecipada do contrato por parte do clube, sem justa causa. Nesse caso, o atleta tem direito a receber uma indenização pelo encerramento do vínculo. A cláusula compensatória é prevista para compensar a perda do contrato, considerando que o atleta poderia ter outras oportunidades de trabalho negadas ao se comprometer com um contrato esportivo de longo prazo.

Para a Cláusula Compensatória Desportiva:

  • O valor é determinado no contrato, com um limite máximo de 400 vezes o valor do salário mensal do atleta.
  • Caso o contrato não estipule uma CCD específica, o atleta terá direito a 100% do valor remanescente até o final do contrato, observando o teto máximo legal.

Ambas as cláusulas — indenizatória e compensatória — são projetadas para garantir que os interesses tanto do clube quanto do atleta sejam protegidos, incentivando um equilíbrio nas relações contratuais no setor esportivo.

Duração dos contratos:

A duração dos contratos desportivos varia de 3 meses a 5 anos no futebol, com uma exceção para o primeiro contrato com o Clube Formador, que é limitado a 3 anos. Estes contratos seguem o princípio constitucional de proteção ao trabalhador, além de serem regidos pela Lei Pelé, pela Lei Geral do Esporte e, em casos internacionais, por regulamentos da FIFA, que estabelecem diretrizes globais.

Definição de Atleta Profissional:

A Lei Geral do Esporte define o atleta profissional como o praticante de esporte de alto rendimento que se dedica de maneira remunerada e permanente, tendo essa atividade como sua principal fonte de renda. Embora o conceito abarque competitividade e excelência, há críticas quanto ao critério de remuneração, pois muitos atletas têm outras fontes de receita, como patrocínios, que podem até superar a remuneração recebida pelo clube.

Caminho do Atleta até a Profissionalização:

O vínculo federativo inicia-se até os 12 anos, com a formação esportiva ocorrendo entre os 12 e 20 anos nas categorias de base. A profissionalização, por sua vez, costuma ocorrer a partir dos 16 anos, sendo permitida a transferência internacional apenas após os 18 anos. A remuneração do atleta inclui salário-base, auxílio-moradia, “luvas” (pagamento realizado no momento da contratação), prêmios por desempenho e o direito de imagem, este último tratado de forma especial nos contratos.

Esse panorama destaca as particularidades dos contratos de trabalho desportivos, fundamentais para assegurar a integridade, o desenvolvimento e a longevidade da carreira do atleta profissional, conforme os critérios estabelecidos pela Lei Geral do Esporte de 2023.

Iara Cruz

@iara-cruz

Artigos acadêmicos

Estudante de Direito na PUC-MG. Integrante dos grupos de estudo GEDD - Grupo de Estudos em Direito Desportivo da UFMG, FUTCLASS - Academia do Futebol, Direito e Gestão no Esporte, GEMedE - Grupo de Estudos em Mediação Empresarial e RED - Retrabalhando o Direito. Fluente nas línguas portuguesa e inglesa, espanhol nível básico.